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A implosão da Seguridade Social

A Constituição de 1988 trouxe para seu manto de proteção diversos direitos sociais, assegurados em seu art. 6, dentre eles a educação, a saúde, o trabalho, a assistência e a previdência. Contudo, decorridos mais de 30 anos de sua promulgação, o Estado não logrou êxito em concretizar tais direitos e, como se não bastasse, tornou-se agente efetivo de violação dos direitos sociais não apenas por meio dos Poderes Executivo e do Legislativo, mas também do Judiciário.

A Seguridade Social, apesar de diversos problemas, apresenta números impressionantes e exerce papel extremamente importante para o equilíbrio da sociedade e subsistência de grande parte da população brasileira, justamente aquela que mais necessita do amparo estatal.

Conforme dados do Boletim Estatístico da Previdência Social de dezembro de 2018, em 2017, o Regime Geral da Previdência Social contava com 51.138.581 contribuintes, sendo que desses 39.051.846 tratavam-se de contribuintes na condição de empregados.

Em dezembro de 2018, a Seguridade Social, somados os benefícios do Regime Geral da Previdência Social, da Assistência Social e aqueles previstos em legislações específicas, possuía cerca de 35.058.564 de benefícios ativos.

Os benefícios do Regime Geral de Previdência Social representavam nessa data 86,37% dos benefícios ativos da seguridade (30.278.655 benefícios). Os benefícios da Assistência Social representavam 13,58% dos benefícios ativos (4.760.966 benefícios). Os outros 0,05% de benefícios ativos (18.943 benefícios) referiam-se a benefícios previstos em legislação específica.

Dentre os benefícios do Regime Geral,  68,17%, ou seja, 20.641.054 referiam-se à benefícios de aposentadoria. Neste grupo, 35,67% tratam-se de aposentadorias por idade, 30,33% de aposentadorias por tempo de contribuição, 16,31% de aposentadorias por invalidez previdenciária e 1,04% de aposentadorias por invalidez acidentária.

Dentre os benefícios da assistência social, 97,71% (4.651.924 benefícios) referiam-se ao Amparo Assistência/Benefício de Prestação Continuada pago a idosos e a deficientes pobres.

Nesse mesmo mês, o valor médio dos benefícios da previdência social era de R$ 1.269,50, sendo que durante o ano de 2018 os benefícios da previdência social foram responsáveis por injetar na economia o valor aproximado de R$ 571.700.000,00 (quinhentos e setenta e um bilhões e setecentos milhões de reais).

A Proposta de Reforma da Previdência, Proposta de Emenda Constitucional 06/2019, se não o mais grave, é um dos maiores ataques aos direitos sociais promovidos desde a promulgação da Constituição Cidadã de 1988 e, caso aprovada, somada à reforma trabalhista aprovada em 2017, representará a implosão desse sistema de Seguridade Social, especialmente em virtude de quatro aspectos a seguir expostos:

  • O primeiro aspecto que demonstra a implosão do sistema de Seguridade Social é a desconstitucionalização do sistema, especialmente no que tange ao rol mínimo de benefícios previdenciários que deixam de ser assegurados pela Constituição e passam a ser estabelecidos por lei complementar.
  • O segundo aspecto é a modificação dos requisitos para concessão do benefício de prestação continuada, que dificultam o acesso a ele, e a redução do valor do benefício devido ao idoso de 65 anos. A proposta apresentada pelo governo modifica os requisitos para comprovação de impossibilidade de manutenção da subsistência, para que no cálculo da renda per capita familiar máxima permitida para deferimento do benefício sejam incluídos todo e qualquer tipo de renda, inclusive os valores recebidos pelo idoso por meio de programas sociais, os valores de rendas de atividades sazonais e os valores referentes a outro benefício de prestação continuada de idoso. Além disso, a proposta estabelece que o interessado deverá comprovar também que o grupo familiar possui um patrimônio familiar menor ao previsto em lei, que, por ora, estaria fixado em R$ 98.000,00 (noventa e oito mil reais), valor esse inferior à qualquer imóvel simples nas periferias das grandes cidades brasileiras.

A proposta também estabelece que o idoso de 65 anos que hoje faz jus ao benefício de um salário-mínimo somente teria direito a um benefício de R$ 400,00, fazendo jus ao benefício de um salário-mínimo somente aos 70 anos.

  • O terceiro aspecto dessa implosão é a majoração do tempo de contribuição mínimo para aposentadoria, que passaria de 15 anos para 20 anos, e, tendo em vista a recente reforma trabalhista e o aumento do trabalho informal, dificultará ainda mais o acesso dos segurados à aposentadoria.
  • O quarto aspecto refere-se ao valor do benefício, que é afetado de três formas diferentes: pela modificação da forma de apuração da média salarial para fins de concessão do benefício, que atualmente considera somente 80% do período contributivo, desconsiderando os 20% referente às menores contribuições, e, com a reforma, passará a considerar todo o período contributivo. Pela modificação do cálculo do valor inicial de benefício, que na maioria das hipóteses será de 60% aos 20 anos de contribuição, acrescido de 2% por ano de contribuição adicional; e o fim da garantia constitucional de manutenção do valor real dos benefícios, o que pode implicar reajustes menores do que a inflação.

Tais aspectos demonstram que a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional representará efetivamente a implosão do Sistema de Seguridade Social estabelecido na Constituição de 1988 e o rompimento definitivo do pacto de construção de um Estado de Bem Estar Social, fatos que somente serão evitados pela ampla mobilização e conscientização da população acerca dos malefícios da PEC nº 06/2019.

Rivadavio de Oliveira Guassú

Sócio da LBS Advogados
E-mail: rivadavio.guassu@lbs.adv.br

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