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Direito a Férias e as alterações com a Reforma Trabalhista

Com a Reforma Trabalhista prestes a entrar em vigor, o Brasil vive um momento de desmonte dos direitos dos trabalhadores. Sob a falácia de modernização da CLT, o governo Temer tenta incutir na cabeça dos cidadãos que a nova legislação irá melhorar as relações de trabalho. Até mesmo a possibilidade de parcelamento das férias em três vezes, pelo empregador, é apresentada como um grande avanço.

Nesse sentido, o governo simula a ideia de a reforma trabalhista é necessária e positiva, no entanto, o que se vê é o  retrocesso nas conquistas sociais com a flexibilização das formas de contrato, o barateamento de mão de obra e o aumento da jornada de trabalho. 

O direito a férias foi Instituído no Brasil através do decreto n. 4.982, publicado em 1925 , concedendo inicialmente um intervalo de 15 dias, sem prejuízo salarial, aos empregados e operários de estabelecimentos comerciais, industriais, bancários e de empresas jornalísticas.  Passados mais de 90 anos, e graças a luta dos trabalhadores, o direito as férias apresentou grande evolução em nosso ordenamento jurídico, tendo como elemento norteador a melhoria da condição social do trabalhador urbano e rural.

Apesar da forte propaganda midiática incentivada pela fatia empresarial de que a Consolidação das Leis do Trabalho  promulgada em 1943 não mais representa as relações de trabalho atuais e, por ser “velha”, deve ser alterada, ou como gostam de propagandear deve ser modernizada, o atual texto da CLT referente a férias data de alteração promovida em 1977 através do decreto lei 1535/1977  e de forma didática e minuciosa estabelece do artigo 129 ao 145 as regras de concessão, duração, remuneração e abono.

Resumidamente  tem direito a um período de férias, sem prejuízo da remuneração, todo empregado após 12 meses de contrato de trabalho, sendo esse período de 30 dias, caso não tenha faltado mais de 5 vezes sem justificativa, ou, em casos de mais de 5 faltas injustificadas, o artigo 130 da CLT estabelece a proporção das férias que deverão  ser concedidas.

A reforma trabalhista altera o formato de concessão de férias como previsto no artigo 134 da CLT , que estabelece: 

As férias serão concedidas por ato do empregador, em um só período, nos 12 meses subsequentes a data em que o empregado tiver adquirido o direito.
§ 1º- Somente em casos excepcionais serão as férias concedidas em dois períodos, um dos quais não poderá ser inferior a 10 dias corridos.
§ 2º– Aos menores de 18 anos e aos maiores de 50 anos de idade, as férias serão sempre concedidas de uma só vez. 

Portando, o que se tem estabelecido na lei é que, em via de regra, a concessão das férias deve ocorrer em um único ato, sendo que, excepcionalmente há possibilidade de fracionamento em dois períodos, um dos quais não pode ser inferior a 10 dias.

A priorização da concessão das férias em ato único para reposição da energia física e mental do trabalhador, bem como sua inserção familiar, tem sido matéria discutida na atualidade por nossa mais alta corte em matéria  trabalhista, o Tribunal Superior do Trabalho, que tem entendido o fracionamento das férias como medida excepcional,  por não permitir o real descanso do empregado.

Além disso, o gozo das férias é fundamental à saúde e segurança do trabalhador possibilitando, inclusive,  um melhor rendimento no âmbito do trabalho, tendo como principais fundamentos norteadores: o fisiológico, relacionado ao cansaço do corpo e da mente; o econômico, no sentido de que o empregado descansado produz mais; o psicológico, que relaciona momentos de relaxamento com o equilíbrio mental; o cultural, segundo o qual o espírito do trabalhador, em momentos de descontração, está aberto a outras culturas; o político, como mecanismo de equilíbrio da relação entre empregador e trabalhador; e o social, que enfatiza o estreitamento do convívio familiar .

Vale aqui, colacionar a atual jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho sobre a importância da concessão das férias em um único ato assegurando a saúde e segurança do trabalhador, sendo excepcional o fracionamento: 

(…) Com efeito, a regra é de que as férias sejam concedidas em um só período, e somente em situações excepcionais é possível o seu fracionamento. Assim, e reconsiderando posicionamento anterior em face de precedente turmário, entendo que as férias foram parceladas em situação irregular, pois sem a demonstração de ocorrência de caso excepcional, dando ensejo ao seu pagamento em dobro, por não ter sido atingido o intuito precípuo assegurado por norma cogente de política de saúde e segurança do trabalho.  (TST-E-RR- 6500-92.2008.5.04.381, SBDI-I, rel. Ministro Augusto César Leite de Carvalho, 31.05.2012)

“FÉRIAS. FRACIONAMENTO IRREGULAR. O art. 134 da CLT, ao prever que as férias serão concedidas num só período, deixou clara a sua finalidade, qual seja a de proteção à saúde do empregado, bem como sua inserção familiar. Portanto, somente em situações excepcionais (o que não é o caso dos autos) é possível o seu parcelamento e, assim mesmo, limitado a dois períodos, um deles não inferior a 10 (dez) dias corridos (CLT, artigo 134, § 1º). Logo, o parcelamento irregular enseja o pagamento da dobra, por não atingir o intuito precípuo assegurado pela lei. Precedentes. Recurso de revista não conhecido.” (Processo: RR – 49700-52.2008.5.04.0381 Data de Julgamento: 28/06/2011, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 1/7/2011)

Porém, e contrariando a política de saúde e segurança do trabalhador e a atual jurisprudência do TST, A Reforma Trabalhista permitirá o parcelamento das férias em até 3 vezes, além de revogar a determinação da concessão das férias em ato único para os menores de 18 anos e maiores de 50 anos, alterando os parágrafos do artigo 134 , conforme segue:

Artigo 134…
§ 1º Desde que haja concordância do empregador, as férias poderão ser usufruídas em até três períodos, sendo que um deles não poderá ser inferior a quatorze dias corridos e os demais não poderão ser inferiores a cinco dias corridos, cada um.
§ 2º revogado
§ 3º É vedado o início das férias no período de dois dias que antecede feriado ou dia de repouso semana remunerado.

Na verdade a alteração é um verdadeiro engodo, senão vejamos:

– as férias continuam sendo ato do empregador e portanto somente quando for de interesse do Capital é que o empregado poderá fracionar suas férias.

– possibilidade de tirar 5 dias de férias, ou seja: quarta, quinta, sexta, sábado e domingo, portanto, 2/5 das férias é de DSR. 

– Tornar emendas de feriados em férias;

– A concessão das férias em ato único para menores de 18 e maiores de 50 anos é prevista para resguardo da segurança e saúde do trabalhador, a proposta de revogação do parágrafo segundo do artigo 134 da CLT viola a integridade física e metal do trabalhador nessa condição. 

Na prática, tomando por base a categoria bancária, o que vemos é a grande pressão do empregador para que o empregado “venda” 1/3 das férias (artigo 143 da CLT) usufruindo 20 dias corridos de acordo com o interesse do Banco. 

E, infelizmente, muitos trabalhadores estão caindo no “canto da sereia” apoiando a reforma e imaginando gozar de 3 períodos de férias, sem entender que a alteração, na verdade, precariza o direito de usufruir férias vez que, conforme amplamente exposto, não considera a pausa como necessária para um descanso real de preservação da saúde, segurança e inserção familiar.

Cabe lembrar que uma vez fracionado o período férias, o gozo deve ocorrer dentro de 12 meses de concessão sendo que, “os dias gozados após o período legal de concessão deverão ser remunerados em dobro” Súmula nº 81 do TST.

Por todo exposto, resta claro que não teremos modernização (palavra que tem como  sinônimo:  evolução). Teremos sim um retrocesso do direito do trabalhador, precarizando o direito de descanso efetivo o qual se encontra devidamente resguardado na legislação atual, que inclusive já prevê excepcionalmente, o fracionamento das férias.

Observação: Este texto foi publicado originalmente no livro Direito do Trabalho Bancário: Temas Atuais da Reforma Trabalhista: Enfrentamento e Resistência (Projeto Editorial Praxis). Versão atualizada pelas autoras.

REFERÊNCIAS

1) DECRETO N. 4.982 – DE 24 DE DEZEMBRO DE 1925 Manda conceder, annualmente, 15 dias de férias aos empregados e operarios de estabelecimentos commerciaes, industriaes e bancarios, sem prejuizo de ordenado, vencimentos ou diarias e dá outras providências http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=44832

2)http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del1535.htm 

3)http://www.tst.jus.br/home?p_p_id=15&p_p_lifecycle=0&p_p_state=maximized&p_p_mode=view&_15_struts_action=%2Fjour

nal%2Fview_article&_15_groupId=10157&_15_articleId=318181&_15_version=1.0

 

Luciana Lucena B. Barretto

Sócia da LBS Advogados
E-mail: luciana.barretto@lbs.adv.br

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