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Todas as trabalhadoras gestantes e adotantes são iguais!

Todas as trabalhadoras gestantes e adotantes são iguais!

A Constituição federal, nosso ordenamento jurídico máximo, garante, em seus artigos 226 e 227, a total proteção a crianças e à família. Nesse contexto, no artigo 10, II, b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, é garantido às empregadas gestantes o direito à estabilidade a partir da confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.

Dentre as mulheres que trabalham, algumas, todavia, o fazem sem qualquer forma de garantia trabalhista, como é o caso daquelas que ocupam cargos comissionados no Governo Federal, por exemplo. A forma de contratação, na maioria das vezes, é realizada por simples nomeação, sem a empregada pertencer ao regime estabelecido pela CLT, tampouco aos direitos estabelecidos na Lei nº 8.112/1990. Por tais razões, pode ocorrer ao longo do contrato exonerações, principalmente quando há mudanças no governo.

Dessa forma, as mulheres comissionadas por simples nomeação grávidas e as mães de bebês de até cinco meses não possuem qualquer proteção legal à manutenção de seu labor, sendo comum que os órgãos da Administração Pública as exonerem.

Diante a ausência da garantia expressa a essas mulheres, a Administração Pública, nas três esferas, age discricionariamente, muitas vezes. Podemos verificar órgãos que concedem indenização pelo tempo de estabilidade às exoneradas gestantes, assim como, entes que simplesmente exoneram, sem qualquer estabilidade ou indenização.

O próprio Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, no Ofício-Circular nº 58, de 25/01/2001, em pleno vigor até hoje, afirma a possibilidade de exoneração em qualquer tempo, até em casos de licença-maternidade. Vejamos:

“Informamos que é possível a exoneração, a qualquer tempo, de servidor ocupante de função ou cargo em comissão, ainda que esse servidor esteja legalmente afastado em licença para tratamento da própria saúde, férias, licença gestante ou nos afastamentos previstos no art. 102 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, por se tratar de cargo ou função demissível ad nutum, nos termos do art. 37, inciso II, da Constituição Federal, alterado pela Emenda Constitucional nº 19, de 05/06/1998, o qual estabelece que a investidura em cargo ou comissão é de livre nomeação e exoneração.”

Por outro lado, recentemente, a Advocacia-Geral da União assinou parecer determinando estabilidade de até seis meses às empregadas gestantes e adotantes que ocupem cargos comissionados na Administração Pública.[1] Tal entendimento tem como argumentos não só a garantia constitucional, como a proteção à criança e às famílias, e evitar que mães busquem o Poder Judiciário para garantirem seu direito.

Mesmo com parecer favorável da AGU e decisões atuais do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que tal direito deve ser assegurado a todas as servidoras públicas, independentemente da natureza do vínculo estabelecido com a Administração, ainda presenciamos grávidas e adotantes sendo descomissionadas.

Vejamos a posição do STF:

“(…) a jurisprudência desta Suprema Corte é firme no sentido de que as servidoras públicas ocupantes de função comissionada têm direito à licença-maternidade e à estabilidade provisória, conforme previsto no art. 7º, inc. XVIII, da Constituição e no art. 10, inc. II, alínea ‘b’, do ADCT.” (Recurso Extraordinário com Agravo nº  1.022.346, Min. Relator Dias Toffoli, DJe  22/02/2017)

O que merece atenção é a discricionariedade do Estado em conceder ou não uma indenização pela ruptura da estabilidade no momento da exoneração. O direito à estabilidade gestante não pode ser tratado como mera opção! Estamos falando de uma nova vida, de uma criança que necessita de cuidado e proteção incondicional, o que não ocorrerá na hipótese de exoneração sem qualquer vencimento.

A contradição é gritante! Por um lado, o ordenamento jurídico garante a proteção à criança e à mãe. Por outro, permite que órgãos estatais exonerem trabalhadoras comissionadas.

Ora, a estabilidade representa proteção à criança e à família, por isso, é direito fundamental e, como tal, não pode ser relativizada! A proteção à criança e à família abrange a possibilidade de que toda gestante ou a mãe possua condições financeiras e psicológicas para cuidar bem do bebê.

A mulher que trabalha na Administração Pública e está grávida, em estado de vulnerabilidade, acaba tendo que se preocupar com o seu sustento básico, pois pode ser exonerada e não possuir mais qualquer forma de trabalho, considerando, ainda que, provavelmente, não conseguirá tão cedo nova oportunidade.

Por que o tratamento é desigual? A manutenção desse tipo de ato da Administração é condenar a criança e a mulher a uma situação de miserabilidade, indo de encontro com a obrigação do Estado e aos ditames constitucionais.

É imprescindível que a sociedade e os atores de defesa dos direitos das crianças e mulheres se organizem para a defesa dessas gestantes que prestam serviço público e, consequentemente, servem a sociedade.

É necessário debater com a Administração Pública! A melhora de nosso sistema social ocorrerá apenas quando os princípios norteadores de nossa Constituição deixarem de ser relativizados.

Todas as trabalhadoras gestantes e adotantes são iguais!

Vitor Santos de Godoi

*Artigo atualizado, publicado em 26 de fevereiro de 2016.

[1] Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2018-09/agu-da-parecer-pela-estabilidade-de-gestante-em-cargo-comissionado>. O parecer, contudo, ainda não vincula a Administração, já que precisa ser aprovado pela Presidência da República e publicado com o despacho presidencial.

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