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Trabalhadores: terão menos diretos que o cidadão comum?

Na sessão de quinta-feira, 5 de setembro de 2019, o Plenário do Supremo Tribunal Federal deu continuidade ao julgamento do RE nº 828.040, com repercussão geral reconhecida, interposto pela Protege S/A – Proteção e Transporte de Valores, no qual se discute a possibilidade de responsabilização objetiva de empregador por danos decorrentes de acidente de trabalho em atividades de risco.

O julgamento da tese, porém, em razão da polêmica que se instaurou no Plenário, ficou suspenso para quando estivessem presentes todos os ministros. Estavam ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de Mello e Dias Toffoli.

O que é responsabilidade objetiva?

A responsabilidade objetiva impõe o pagamento de indenização por dano independentemente de dolo ou culpa do empregador, quando a atividade normalmente desenvolvida implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem (art. 927, parágrafo único, do Código Civil).

O caso

A empresa de segurança e transporte de valores questionava decisão do Tribunal Superior do Trabalho que a condenou ao pagamento de indenização a vigilante de carro-forte que ficou incapacitado para o trabalho, com distúrbios psicológicos em razão de assalto sofrido em via pública. Para a empresa, houve desrespeito ao art. 7º, XXVIII, da Constituição, pois o assalto foi praticado por terceiro, sem conduta dolosa ou culposa do empregador.

Julgamento

Em seu voto, no dia 04/09, o Relator, Ministro Alexandre de Moraes, entendeu ser o art. 927, parágrafo único, do Código Civil plenamente compatível o art. 7º, inciso XXVIII, do texto constitucional, sob o fundamento de que este prevê garantia mínima ao trabalhador, a qual, à luz do seu “caput”, dever ser ampliada, nunca restringida. No mesmo sentido, o Ministro Ricardo Lewandowski esclareceu que este direito faz parte de um conjunto de garantias constitucionais destinadas à pessoa humana, gênero no qual os trabalhadores não podem ser excluídos.

No julgamento, as Ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia, assim como os Ministros Edson Fachin e Ricardo Lewandowski, acompanharam integralmente o Relator, declarando o não provimento do RE nº 828.040, ou seja, negando o recurso da empresa.

O Ministro Roberto Barroso também declarou o não provimento do recurso, entendendo, contudo, que a responsabilidade objetiva deveria restringir-se à regra do art. 193 da CLT, que, por seus incisos, relaciona atividades ou operações tidas como perigosas. O Ministro Marco Aurélio, em seguida, divergiu, no sentido de que a Constituição assegura a indenização apenas nas hipóteses de responsabilidade subjetiva, comprovado dolo ou culpa.

Hoje, 05/09, votaram os Ministros Gilmar Mendes e Luiz Fux.  Aquele seguiu o mesmo entendimento do Ministro Roberto Barroso; este divergiu, seguindo Marco Aurélio.

A Corte, assim, por maioria, por 7 votos a 2, negou provimento ao recurso, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Luiz Fux.

Tese

No caso de recurso extraordinário com repercussão geral, o STF define a denominada tese, espécie de enunciado que valerá para casos judiciais semelhantes em outras instâncias. Prevalecendo o voto do relator do processo, ele é o responsável por sua elaboração e o texto vai para deliberação do Plenário.

No caso, o Ministro Alexandre de Moraes fixou a seguinte tese:

“O art. 927, parágrafo único, do Código Civil é compatível com artigo 7º, XXVIII, da Constituição, sendo constitucional a responsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho, nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano, por sua natureza, apresentar risco especial com potencialidade lesiva e implicar ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade.”

Após a leitura, o Plenário divergiu quanto à parte final do texto, considerando alguns ministros, como Luís Roberto Barroso e Luiz Fux, que os casos de atividades de risco devem ser definidos pela lei. Para eles, deixar que o juiz do trabalho decida se a atividade desenvolvida pelo autor do dano, por sua natureza, apresenta ou não risco abre margem à subjetividade do julgador.

Acompanhando o relator, os Ministros Rosa Weber e Ricardo Lewandowski consideraram que o art. 927 deve ser aplicado de forma irrestrita no caso de acidentes de trabalho. Entender de forma diversa excluiria o juiz do trabalho, impedido de interpretar o artigo 927 do Código Civil. Seria como dar menos direitos aos trabalhadores em comparação aos cidadãos comuns ou consumidores, por exemplo.

Julgamento suspenso

Em razão da polêmica em torno da tese, a Ministra Cármen Lúcia sugeriu que se suspendesse a votação, aguardando que a composição do Plenário estivesse completa, pois ausentes os Ministros Celso de Mello e Dias Toffoli. Não há data fixada para a retomada do julgamento

O que pode acontecer

A prevalecer a tese do Relator, de que o art. 927, parágrafo único, do Código Civil é plenamente compatível com a Constituição, aplicando a responsabilidade objetiva sem culpa ou dolo do empregador nas atividades de risco previstas em lei ou quando forem assim consideradas pelo julgador, o STF assegurará as garantias mínimas previstas no “caput” do art. 7º aos trabalhadores e às trabalhadoras brasileiras.

Caso a tese seja restritiva, não permitindo que o julgador considere determinada atividade como de risco especial, a Corte, infelizmente, estará impondo à classe trabalhadora ônus maior do que aos demais membros da coletividade.

Antonio Fernando M. Lopes

Sócio da LBS Advogados
E-mail: antonio.megale@lbs.adv.br

Ricardo Quintas Carneiro

Sócio da LBS Advogados
E-mail: ricardo.carneiro@lbs.adv.br

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