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Uso de WhatsApp na relação de emprego

Iniciada a partir da segunda metade do século XX, a revolução tecnológica rapidamente ganhou proporções inusitadas, de modo que até os dias atuais se mostra em evolução contínua, apurada e presente na vida social e profissional de muita gente. Smartphones, tablets, notebooks, macbooks e etc. são exemplos de produtos inteligentes provenientes do contexto atual tecnológico, em regra, à disposição para todas as classes sociais, tratando-se de ferramentas que viabilizam a globalização mundial.

Contemporaneamente com os produtos supras e utilizáveis a partir deles, surgiram as redes sociais e os aplicativos de celulares, sistemas que solidificaram os relacionamentos online e por meio dos quais o ambiente real passou a ser “replicado” dentro desse universo virtual, como um segundo espaço e com o mesmo propósito e utilidade. Dentre a diversidade desses sistemas, atualmente se destaca o whatsapp, aplicativo destinado à troca de mensagens instantâneas, facilitador da comunicação de curta e longa distância.

Com ele, a troca intensa de mensagens, nos diversos grupos, a qualquer hora, tornou-se prática comum e notável desde no estádio de futebol até em espaços destinados ao ambiente de trabalho. E em se tratando de ambiente de trabalho, certamente o aplicativo em análise cada vez mais se faz presente nas relações de empregos, fenômeno que, por sua peculiaridade, tem relevância para o mundo jurídico, pois a sua irrestrita e má utilização pode gerar supressão de direitos e acarretar demandas judiciais trabalhistas, conforme já se observa no dia-a-dia forense.

Fato é que pela sua praticidade e agilidade, o “zap” passou efetivamente a ser utilizado pelas empresas como ferramenta de trabalho, sendo certo que os grupos profissionais não causam mais estranheza a ninguém. No entanto, não podemos esquecer que o mundo virtual reproduz o espaço real e, nesse sentido, as atitudes de gestores e empregados refletem e geram efeitos a partir do diálogo por mensagens.

Ser acionado por meio do whatsapp após o término do expediente ou durante o intervalo para o almoço para resolver questões relacionadas ao trabalho pode configurar tempo à disposição do empregador e, consequentemente, gerar horas extras; os excessos dos gestores por meio do aplicativo na cobrança de metas, a referência de forma degradante e/ou pejorativa em face do empregado, a exposição negativa e vexatória do trabalhador são elementos aptos a configurar assédio moral e impulsionar reclamação trabalhista, por meio da qual se pleiteara indenização por danos morais; o vínculo de emprego também pode ser provado a partir de mensagens trocadas pelo aplicativo.

Exemplo de situação relacionada a assédio moral por meio do whatsapp pôde ser processada e julgada pelo Tribunal Regional do Trabalho de Santa Catarina. A loja de artigos esportivos Diederichsen-PR, de Itajaí/SC, foi condenada a pagar R$ 13 mil a uma ex-empregada que comprovou ter sofrido assédio moral por meio do aplicativo. Através das mensagens, que eram compartilhadas diariamente com a equipe, além de fazer piadas com o corpo da funcionária, o supervisor chamava a subordinada de “gorda”, “feia”, “bunda mole” e “bigoduda”.

Por outro lado, importante destacar que da mesma forma que o aplicativo tem o condão de assegurar direitos suprimidos do trabalhador, pode também servir como base argumentativa para gerar advertência ou até mesmo a demissão do funcionário por justa causa. Ao expressar a sua opinião no ambiente virtual, o empregado deve se acautelar, pois a extrapolação dos limites da opinião, alcançando termos ofensivos ao empregador ou aos seus prepostos, por exemplo, pode dar ensejo à demissão por justa causa, com base no art. 482, alínea K, da CLT: “ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem.”

Em tempo, é preciso registrar que os “prints” das mensagens são perfeitamente aceitáveis como meio de prova das alegações e, na prática, vem sendo utilizado em larga frequência na justiça trabalhista.

Como visto, a utilização do whatsapp na relação de emprego é revestida de nuances que devem ser observadas tanto pelo empregado quanto pelo empregador, a fim de evitar supressão de direitos trabalhistas e demandas judiciais. Nesse aspecto, medidas preventivas podem e devem ser exercidas com a finalidade de evitar os dissabores provenientes da relação virtual.

Instituir políticas coerentes e claras sobre o uso da ferramenta pode ser um caminho utilizado pela empresa, a fim de organizar a troca de mensagens online de forma ética e sadia. Outro ponto importante é o dever do empregador de orientar os seus gestores a não cometer excessos tanto no ambiente real, quanto no virtual e, em caso de transgressões, tomar imediatamente medidas visando inibir ação dos seus prepostos e garantir a integridade física e psicológica do trabalhador.

A Convenção Coletiva de Trabalho dos Bancários 2016/2018, da qual é signatário o Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Campinas e Região, é um exemplo a ser seguido sobre o tema em questão. O Parágrafo Único da Cláusula 37 veda o gestor de cobrar o cumprimento de meta por mensagens, no telefone particular do empregado: 

MONITORAMENTO DE RESULTADOS
Cláusula 37:

No monitoramento de resultados, os bancos não exporão, publicamente, o ranking individual de seus empregados.

Parágrafo Único
É vedado, ao gestor, a cobrança de cumprimento de resultados por mensagens, no telefone particular do empregado. 

Nitidamente, a cláusula em comento tem o condão prevenir os “assédios morais virtuais” exercidos por gestores em face dos trabalhadores bancários. Veja-se que ao inibir a prática de cobrança de resultados por mensagem no telefone particular do empregado, a norma regulamentadora previne um possível dano existencial dos obreiros, pois, se a liberdade de cobrança fosse irrestrita jamais o trabalhador conseguiria se desvincular do trabalho nos horários destinados aos descansos, à vida social e familiar.

Medida como essa se mostra totalmente coerente com o atual contexto tecnológico e, certamente, desempenha um importante papel de proteção ao empregado. Conforme se vê, dia após dia novos equipamentos eletrônicos são inventados e reinventados numa era em que tudo aceleradamente se globaliza. Acompanhando e complementando estes fenômenos, as redes sociais e os aplicativos também são criados, inovados e, pelas suas utilidades, frequentemente introduzidos nas relações de emprego. Neste aspecto, tanto a legislação trabalhista quanto a Justiça do Trabalho também devem acompanhar essas mudanças, a fim de assegurar um ambiente de trabalho organizado, dentro dos preceitos instituídos para principalmente proteger o trabalhador.

Empregadores e empregados velando pela utilização estritamente profissional do aplicativo quando relacionados às questões de trabalho, têm à disposição uma excelente ferramenta apta a otimizar o labor diário. 

Referências:
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI253058,61044-Comentario+no+WhatsApp+da+demissao+por+justa+causa
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI216301,61044-Vendedora+assediada+via+WhatsApp+sera+indenizada
http://justificando.cartacapital.com.br/2015/02/27/funcionaria-consegue-comprovar-ter-sofrido-assedio-moral-por-meio-whatsapp/
http://www.sindicatocp.org.br/fileadmin/user_upload/noticias/2016_outubro/CCT_-_FEEB_SP-MS_assinada.pdf
 
 

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