A enfermagem deu mais um passo na efetivação do piso nacional. A luta que já dura 30 anos.
No dia 18 de abril de 2023, o Presidente da República assinou projeto de lei que viabiliza a efetivação do piso nacional da enfermagem.[1] Trata-se do Projeto de Lei do Congresso Nacional (PLN) 5/2023, que abre crédito especial ao Orçamento da Seguridade Social para possibilitar o pagamento.
No Congresso Nacional, o PLN foi aprovado pela Comissão Mista de Orçamento em 25/04/2023.
Hoje, 26/04/2023, o Plenário do Congresso aprovou o projeto em sessão conjunta com deputados e senadores.
Há um acordo para que seja encaminhada uma Medida Provisória no prazo máximo de 30 dias, com objetivo de dar eficácia imediata à implementação do piso.
Outra decisão do Congresso, tomada hoje, foi pela manutenção do veto ao reajuste automático do piso salarial da enfermagem pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). Esse veto foi feito pelo governo anterior, na Lei 14.434 de 4 de agosto de 2022, que institui o piso salarial nacional do Enfermeiro, do Técnico de Enfermagem, do Auxiliar de Enfermagem e da Parteira.
O Projeto abrangerá apenas o período de maio a dezembro de 2023, pois, para os anos seguintes, o custeio do piso deverá ser previsto no orçamento anual da União.
Além do PLN da enfermagem, também foi aprovado o projeto que estabelece o reajuste de 9% aos servidores públicos federais.
Entenda o histórico
O piso salarial nacional do Enfermeiro, do Técnico de Enfermagem, do Auxiliar de Enfermagem e da Parteira foi instituído pela Lei nº 14.434, de 4 de agosto de 2022[2].
Contudo, por decisão do Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7.222, em setembro de 2022, houve a suspensão do piso, sob argumento de que a legislação não indicou a fonte de custeio para os pagamentos, e que seria necessário apresentar estimativa sobre os impactos orçamentários e financeiros[3].
Para resolver a questão sobre de onde sairiam os recursos, foi aprovada a Emenda Constitucional nº 127/2022, que tramitou no Senado sob a forma da PEC nº 42/2022, e direciona recursos do superávit financeiro de fundos públicos e do fundo social para financiar o piso.
A União custeará as despesas com a complementação do excedente orçamentário dos Estados, Municípios, entidades filantrópicas e redes particulares que possuem o mínimo de 60% dos pacientes atendidos pelo Sistema Único de Saúde.
O Piso Nacional da Enfermagem na prática
A previsão é de recebimento a partir de R$ 4.750,00 para enfermeiros; R$ 3.325,00 para técnicos em enfermagem; e R$ 2.375,00 para os auxiliares de enfermagem e parteiras.
A Lei nº 14.434, de 4 de agosto de 2022, que institui o piso da enfermagem, não estabelece carga horária para o piso, o que conduz imediatamente à interpretação de que o seu pagamento não depende da carga horária. Por outro lado, também pode abrir espaço para que valor atribuído ao piso salarial seja aplicado com proporcionalidade.
Para celetistas, o piso será aplicado sobre o salário-base; já para estatutários, no vencimento-base.
Para os trabalhadores celetistas, a revisão salarial deverá ser incluída nos acordos individuais e coletivos, sendo considerada ilegal e ilícita a sua desconsideração ou supressão.
O piso também se aplica aos trabalhadores das cooperativas, da mesma forma que aos celetistas.
Os aposentados, desde que tenham direito à paridade, poderão ter a implementação do piso.
Assim, cada caso deverá ser analisado, com objetivo de verificação sobre a incidência de paridade.
É vedado o pagamento de gratificações salariais para burlar o cumprimento da Lei do Piso, pois é o salário-base que deve atingir o valor, e não outra parcela remuneratória fora dele, como bonificações.
Gratificações em geral, gratificação de insalubridade e outros benefícios não serão impactados ou reduzidos.
Também deverá ser garantida a manutenção de salários eventualmente superiores ao valor do piso, independentemente da jornada de trabalho.
Próximos passos para a garantia de efetivação do Piso
É possível que, após a aprovação pelo Congresso nacional do PNL que abre espaço no orçamento da União para o custeio do piso, somado à indicação da fonte de recursos, já efetuada pela EC nº 127/2022, e medida provisória que promova efeitos imediatos, o STF reveja seu entendimento, com posicionamento favorável à implementação do piso.
Posteriormente, após a aprovação do PLN, e medida provisória a ser entregue, deverá ser publicada portaria do Ministério da Saúde, garantindo a aplicação do piso nacional.
Os Estados e Municípios deverão adequar a remuneração dos cargos ou dos respectivos planos de carreiras para atender aos pisos estabelecidos para cada categoria profissional. É possível que façam regulamentações mais específicas, por exemplo, previsão de aplicação do piso de forma escalonada e definição de quantidade de horas para aplicação proporcional.
Contudo, caso haja demora pelos Estados e Municípios na regulamentação, após a aguardada aprovação do PNL, medida provisória e Portaria do Ministério, isso não deve constituir empecilho para o pagamento do piso, e poderá gerar direitos a recebimento de valores retroativos, contados desde a data da não implementação.
O piso da enfermagem terá observância obrigatória, isso significa que “desculpas” orçamentárias não poderão impedir a implementação, por tratar-se de instrumento de valorização da enfermagem, profissionais essenciais para a garantia do direito à saúde (art. 196 da Constituição federal) à população, sendo dever do Estado conferir aplicabilidade imediata e a máxima eficácia, sem entraves.
O desrespeito ao piso deverá ser denunciado aos sindicatos e ao Ministério Público do Trabalho. Fiquemos atentas e atentos!
26 de abril de 2023.
[1] Disponível em: https://www.gov.br/planalto/pt-br/acompanhe-o-planalto/noticias/2023/04/lula-assina-projeto-de-lei-que-garante-r-7-3-bi-para-piso-da-enfermagem. Acesso em 19/04/2023
[2] Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-14.434-de-4-de-agosto-de-2022-420535072. Acesso em 19/04/2023
[3] Disponível em: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=499844&ori=1 Acesso em 19/04/2023
Camilla Cândido
Sócia da LBS Advogadas e Advogados
Mádila Barros
Advogada da LBS Advogadas e Advogados