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Trabalho dos bancários aos sábados – Medida Provisória nº 881, de 29 de abril de 2019 – Questões jurídicas

INTRODUÇÃO

A Medida Provisória nº 881, de 29 de abril de 2019, que trata da “Declaração de Direitos de Liberdade Econômica e Estabelece Garantias de Livre Mercado”, foi aprovada pelo Congresso Nacional, em votação definitiva no Senado Federal no dia 21 de agosto de 2019, indo agora à sanção presidencial.

Desde já, é importante salientar que a regra geral incluída pela Câmara dos Deputados, e a partir de então defendida pelo governo, que previa ampla autorização de trabalho aos domingos e trazia impactos danosos à toda a classe trabalhadora, foi derrubada.

Assunto de relevo para a categoria bancária e, portanto, objeto desta Nota, é a revogação expressa do artigo 1º da Lei nº 4.178/1962, que dispunha que “os estabelecimentos de crédito não funcionarão aos sábados, em expediente externo ou interno.”

Visando esclarecer as dúvidas iniciais acerca do texto, apresentamos as seguintes considerações, tão objetivas quanto possível:

DOS BANCÁRIOS EM GERAL

Os trabalhadores bancários historicamente trabalham de segunda a sexta-feira, havendo disposição expressa acerca dos sábados no artigo 224 da Consolidação das Leis do Trabalho:

Art. 224 – A duração normal do trabalho dos empregados em bancos, casas bancárias e Caixa Econômica Federal será de 6 (seis) horas contínuas nos dias úteis, com exceção dos sábados, perfazendo um total de 30 (trinta) horas de trabalho por semana.

A revogação do art. 1º da Lei nº 4.178/1962, que significa a remoção do impedimento de abertura dos estabelecimentos de crédito aos sábados, traz como consequência a obrigatoriedade do trabalho dos bancários aos sábados?

Como o art. 224, transcrito acima, diz, a duração normal do trabalho dos bancários, de 6 (seis) horas diárias, se dá nos dias úteis “com exceção dos sábados.” Assim, a possibilidade de abertura dos estabelecimentos de crédito aos sábados não implica necessariamente o trabalho destes bancários.

Os bancários incluídos na regra do caput do art. 224 da CLT, aqueles que possuem jornada de 6 (seis) horas diárias, por consequência, não podem exercer suas atividades normais nos sábados, permanecendo a sua jornada histórica de segunda a sexta-feira.

Em caso de eventual trabalho em sábado, a jornada correspondente será extraordinária e, como tal, sujeita à regra do art. 61 da CLT, que diz que o trabalho extraordinário é aquele que ocorre apenas por necessidade imperiosa do serviço (ou em casos de acordo individual ou coletivo).

Com relação aos bancários cuja jornada de trabalho é de 8 (oito) horas diárias, os chamados “cargos de confiança bancária” (direção, gerência, fiscalização e chefia), por se enquadrarem na exceção da jornada de 6 (seis) horas não estão protegidos pela regra de jornada normal. Assim, em princípio, não estão proibidos de exercerem sua jornada normal de trabalho aos sábados.

Ocorre que a aplicação de uma norma legal não pode ser analisada senão dentro de um esforço de interpretação que junte diferentes dispositivos constitucionais e legais. Analisando sistematicamente, parece não fazer sentido a abertura de um estabelecimento sem o seu quadro de empregados normal, sem o quadro de empregados que são a regra geral do trabalho bancário – justamente os bancários com jornada de trabalho de 6 (seis) horas. Parece que os dias “normais” de funcionamento dos estabelecimentos de crédito são aqueles dias “normais” de trabalho daqueles empregados que, por Lei, constituem a base geral dos trabalhadores bancários – e que justamente por este motivo estão incluídos no caput do art. 224 da CLT.

A abertura de estabelecimento bancário aos sábados, por esta ótica, apesar de permitida, não seria “normal”, mas extraordinária e qualquer trabalho desenvolvido nestes dias assim deve ser considerado: extraordinário.

Essa interpretação da legislação não é, no entanto, óbvia e estará sujeita à disputa.

Na pior das hipóteses, os bancários que já trabalham nestes cargos de confiança, com jornada de 8 (oito) horas, e já possuem jornada normal estabelecida nos dias úteis, não podem ter suas jornadas alteradas unilateralmente pelo empregador, por se tratar de cláusula contratual já incorporada.

DAS NORMAS ESPECÍFICAS

Cabe destaque que o Acordo Coletivo da Caixa Econômica Federal também assegura, literalmente, a jornada normal de segunda a sexta-feira, em sua cláusula 23:

CLÁUSULA 23 – JORNADA DE TRABALHO E INTERVALO PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO

A duração da jornada de trabalho normal dos empregados da CAIXA será de 6 (seis) horas diárias, de segunda a sexta-feira, perfazendo 30 (trinta) horas semanais, conforme o art. 224 da CLT e ressalvados seus parágrafos.

Na Convenção Coletiva de Trabalho da FENABAN e no ACT do Banco do Brasil, não há cláusula equivalente, restando o reconhecimento implícito dessa mesma regra, quando fala dos reflexos de horas extraordinárias:

CCT FENABAN, cláusula 8ª

Parágrafo primeiro – quando prestadas durante toda a semana anterior, os bancos pagarão, também, o valor correspondente ao repouso semanal remunerado, inclusive sábados e feriados.

ACT Banco do Brasil, cláusula 4ª

Parágrafo Primeiro – Quando prestadas durante toda a semana anterior, o BANCO pagará, também, o valor correspondente ao repouso semanal remunerado, inclusive sábados e feriados.

ACT Caixa, cláusula 8ª

Parágrafo Quarto – As horas extraordinárias pagas deverão integrar o pagamento do repouso semanal remunerado, considerados os sábados, domingos e feriados, décimo terceiro salário e férias, inclusive nas indenizações rescisórias dessas parcelas.

No caso da Caixa Econômica Federal, existe ainda previsão de trabalho em sábados, domingos e feriados, através de cláusula que regula o trabalho excepcional em regime de revezamento para atividades específicas.

EM CONCLUSÃO

1º) a legislação trabalhista, art. 224 da CLT, contém dispositivo específico tratando da jornada de trabalho normal dos bancários, prevendo sua jornada de segunda a sexta;

2º) os empregadores defenderão a tese de que os ocupantes de “cargos de confiança” poderão desenvolver atividades normais aos sábados, porém não entendemos assim, afigurando-se inarredável a disputa interpretativa;

3º) somente se cogitaria trabalho aos finais de semana mediante pagamento de horas extras;

4º) além disso, há previsões em normas coletivas que enunciam os dias do final de semana como dias de repouso semanal remunerado (Bancos Privados, BB e Caixa, por exemplo);

5º) No caso da Caixa, essa proteção em ACT é ainda mais densa, por haver previsão da jornada normal de segunda a sexta, cláusula específica para trabalho em revezamento aos finais de semana e disposição expressa quanto a sábados, domingos e feriados.

São Paulo, 22 de agosto de 2019.

 

José Eymard Loguercio

Sócio da LBS Advogados
E-mail: eymard@lbs.adv.br

Nilo Beiro

Sócio da LBS Advogados
E-mail: nilo@lbs.adv.br

Paulo Roberto Alves da Silva

Sócio da LBS Advogados
E-mail: paulo.silva@lbs.adv.br

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