Nos dias 7 e 8 de novembro de 2024, São Paulo sediou o 30º Encontro do Coletivo Nacional de Advogados de Servidores Públicos (CNASP). O evento teve como objetivo discutir temas de grande relevância para a advocacia no setor público, além de abordar mudanças sociais significativas que impactam essa área.
Responsabilidade Civil e Meio-ambiente do Trabalho – Paulo Roberto Lemgruber Ebert
Após a abertura do encontro, a primeira mesa, presidida pelo professor-monitor da disciplina “Saúde, Ambiente e Trabalho I” da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Dr. Paulo Roberto Lemgruber Ebert, abordou o tema “Responsabilidade Civil e Meio Ambiente do Trabalho”.
O palestrante examinou o ambiente de trabalho à luz dos conceitos de meio ambiente comum, classificando assédios e acidentes de trabalho como formas de “poluição” do ambiente laboral. Em sua análise, destacou a falta de treinamento adequado para os trabalhadores e as dificuldades em consolidar o conceito de felicidade no trabalho, o que aumenta a complexidade para definir e alcançar a satisfação e o bem-estar no ambiente profissional.
Na abordagem sobre a responsabilidade civil no ambiente laboral, enfatizou-se a importância da prevenção, transcendendo a mera atribuição de culpa ao empregador. O professor ressaltou a necessidade de superar o conceito tradicional de responsabilidade objetiva e de reconhecer que a “poluição” no ambiente de trabalho não deve ser vista apenas como um problema externo à empresa, mas também como um desafio interno ao próprio espaço corporativo.
Dentro desse contexto, o ambiente de trabalho foi reconhecido como um bem jurídico a ser protegido, essencial para a garantia da saúde e segurança dos trabalhadores. Para o professor, a responsabilidade de reparação persiste enquanto houver risco, reforçando a importância de um ambiente laboral seguro e saudável.
Por fim, ressaltou-se a importância da participação ativa dos sindicatos na fiscalização e implementação das políticas de proteção e segurança no trabalho, essenciais para a construção de um meio ambiente laboral mais seguro e saudável.
Inteligência Artificial no Judiciário e Direitos Fundamentais – Sérgio Amadeu da Silveira (UFABC)
A segunda mesa tratou sobre o tema da inteligência artificial (IA) no judiciário e seus impactos sobre os direitos fundamentais. O professor explicou os conceitos por trás do “aprendizado de máquina”, destacando que se trata de uma técnica projetada para aprimorar a análise e a tomada de decisões com base em experiências anteriores, utilizando algoritmos específicos. Esses sistemas, longe de serem “inteligentes” ou “mágicos”, operam conforme os parâmetros para os quais foram programados e treinados.
No entanto, os algoritmos de aprendizado de máquina podem incorporar vieses e discriminações, derivados do histórico dos dados, da base de dados empregada e do próprio design do algoritmo. Esses vieses podem levar a resultados que reforçam desigualdades ou estigmatizações preexistentes, o que é especialmente preocupante quando tais algoritmos são usados para decisões no âmbito jurídico.
Atualmente, aproximadamente 40% dos dados em nuvem são processados pela Amazon. As grandes empresas de tecnologia (“big techs”) dominam o armazenamento e processamento de dados, seguidas por universidades, que ocupam a terceira posição. Um exemplo dessa concentração de dados em grandes empresas é o caso do SISU, que armazena e compartilha dados sensíveis de minorias em plataformas como o LinkedIn, pertencente à Microsoft.
O professor enfatizou que análises automatizadas devem ser conduzidas de maneira responsável, protegendo dados sensíveis e prevenindo vieses e discriminações embutidos nos algoritmos. Ele também alertou para a necessidade de discutir a prática de o governo fornecer dados gratuitamente a grandes corporações, uma vez que isso pode gerar assimetrias de poder e dependências nas áreas de tecnologia e inovação, impactando a soberania e a autonomia no tratamento de informações estratégicas.
Lançamento da Cartilha do GT Educação
Ao final do primeiro dia do encontro, foi apresentada a cartilha desenvolvida pelo coletivo com diretrizes para o setor de educação.
Grandes Temas Tribunais Superiores
No segundo dia do encontro, foram discutidos grandes temas relacionados aos Tribunais Superiores, com destaque para os temas 1.175, 692, 1.190 e 973 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e os temas 1.254 e 799 do Supremo Tribunal Federal (STF). Os advogados presentes analisaram as implicações práticas dessas decisões em suas áreas de atuação, abordando como os entendimentos dos tribunais impactam questões fundamentais no exercício da advocacia pública e na defesa de direitos dos servidores.
Durante as discussões, foram explorados os desdobramentos jurídicos e sociais das decisões, considerando como elas afetam desde a interpretação de leis até a formulação de políticas públicas. Os advogados também debateram estratégias de atuação diante dessas jurisprudências, visando à defesa efetiva dos interesses dos servidores públicos e à proteção de direitos fundamentais no contexto das transformações jurídicas atuais.
Ferramentas tecnológicas para escritórios – Breno Perez
Nessa mesa, foram apresentadas ferramentas desenvolvidas para auxiliar a advocacia e os sindicatos em suas atividades. Uma das principais dificuldades identificadas foi a troca de informações com clientes sindicalizados, o que pode prejudicar a atuação eficaz nos casos.
Com o uso dessas ferramentas, a comunicação e o compartilhamento de dados tornam-se mais ágeis e eficientes, o que fortalece a atuação jurídica e minimiza o risco de que as assessorias jurídicas sejam preteridas diante da nova dinâmica imposta pelo marketing digital. Essas soluções visam, ainda, otimizar o atendimento aos clientes, garantir acesso mais rápido às informações e facilitar a defesa dos direitos dos sindicalizados.
Indenizações para vítimas da COVID: Lei nº 14.128/2021 – Possível extensão para outras categorias profissionais
O tema abordou a possibilidade de pleitear indenização para os profissionais que faleceram em decorrência da COVID-19 durante a pandemia, equiparando esses casos à indenização por acidente de trabalho. A discussão centrou-se na viabilidade jurídica de reconhecer a infecção por COVID-19 como um acidente laboral, especialmente para trabalhadores expostos a maior risco, como profissionais de saúde e aqueles que desempenhavam atividades essenciais.
Foram exploradas as bases legais e precedentes para fundamentar essas indenizações, bem como os desafios de comprovação do nexo causal entre a contaminação e o ambiente de trabalho. Além disso, discutiu-se a importância de políticas de proteção e compensação para as famílias das vítimas, reforçando a necessidade de suporte legal para garantir a reparação adequada nesses casos.
A ADI 2135 e os impactos da decisão no Regime Jurídico Único – Camilla Cândido
Nesta mesa, foram discutidas as implicações da decisão da ADI 2135, em que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o Regime Jurídico Único (RJU) não é obrigatório para a contratação de servidores públicos da administração pública direta. Destacou-se que a jurisprudência está caminhando no sentido de que a estabilidade, após a Emenda Constitucional 103/2019, foi extinta.
Além disso, foi apontado o entendimento da jurisprudência do STF de que a contratação de empregados sob o regime celetista deverá ser direcionada à Justiça Comum.
Durante a fala da advogada Camilla Cândido, sócia da LBS, foi defendida a importância da estabilidade para a Administração Pública e o Estado Democrático de Direito.
Eleições presidenciais nos Estados Unidos
Ao final do encontro, foram discutidos os impactos das eleições presidenciais nos Estados Unidos, com foco nas implicações da eleição de Donald Trump para o estado social da América. Foram abordados temas como as mudanças nas políticas públicas, o enfraquecimento de programas sociais e as reformas econômicas que marcaram sua administração. Além disso, destacou-se como a polarização política e os discursos que afetaram o panorama social e econômico do país, gerando divisões internas e alterando a percepção global sobre a liderança americana.
Brasília, 11 de novembro de 2024.