O estímulo institucional da Justiça do Trabalho pela realização de acordos frente ao Princípio da Irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas

No Direito do Trabalho temos vários princípios que protegem os trabalhadores frente à desigualdade da relação: “empregado x empregador”. Um deles é o Princípio da Irrenunciabilidade ou Indisponibilidade que limita a autonomia de vontade do empregado, não permitindo que este renuncie aos seus direitos trabalhistas.

Em contrapartida, apesar da irrenunciabilidade destes direitos, a própria legislação trabalhista, dentre outras situações, prevê a realização de acordo extrajudicial em Comissão de Conciliação Prévia (art. 625-A a H da CLT) e de acordo durante a tramitação da reclamação trabalhista, no momento de abertura da audiência (art. 846 da CLT) e/ou após as razões finais (art. 850 da CLT).

Além destes momentos, é indiscutível que em qualquer fase processual pode-se firmar acordo. Ou seja, a própria legislação flexibiliza o princípio da irrenunciabilidade dos direitos do empregado.

Entretanto, não é porque existe previsão legal para acordos, que o Judiciário, cujo objetivo é a reparação das lesões causadas ao trabalhador, transforme-se no protagonista do encerramento da demanda a qualquer custo, mesmo que direitos indisponíveis possam ser violados.

Não tenho dúvidas que o desespero institucional pelo acordo é influenciado pelo volume de demandas e por regras de produtividade dos magistrados impostas pelo Conselho Nacional de Justiça. Atualmente, os Tribunais Regionais Trabalhistas, principalmente o da 15ª Região (Campinas), independentemente da fase processual, investem reiteradamente em audiências para tentativas de conciliação, mesmo que meses antes, a empresa já tenha apresentado pífia proposta de acordo no processo, muitas vezes até em execução. E o pior de tudo é que não é raro os trabalhadores serem pressionados pelos próprios magistrados para aceitarem os acordos, como se as propostas fossem factíveis de aceitação.

É mais do que comum os sites dos tribunais noticiarem conquistas do Judiciário na realização de centenas de acordos, beneficiando milhões de reais aos trabalhadores, mas nunca é mencionado nestas notícias se este benefício representou quase a totalidade do crédito devido ou se o crédito do trabalhador foi reduzido pela metade. Aparentemente houve uma inversão de valores do Judiciário para se atingir um fim que não mais é a reparação de uma lesão, mas a solução de um processo, que serve como critério de produtividade e estatística de seus órgãos fiscalizadores.

A Justiça do Trabalho, que nunca foi tão conciliatória como hoje, não se pode prestar ao papel de instrumento jurídico de redução de passivo trabalhista das empresas. Também é importante que os advogados dos trabalhadores estejam devidamente preparados não apenas no aspecto jurídico de seus processos, mas na esfera contábil do direito de seus clientes, para que tenham condições técnicas de debater numa negociação de acordo os critérios matemáticos do cálculo trabalhista, analisando a base de cálculo do pagamento, período de apuração, índice de correção monetária e juros de mora, utilização dos divisores para apuração das horas extras, incidência dos reflexos, recolhimento do INSS e do imposto de renda, bem como as verbas que tem a sua incidência.

Não se trata de desprezar o esforço da Justiça do Trabalho para solucionar o volume de demandas de seus jurisdicionados ou simplesmente criticar o comportamento desenfreado do Judiciário para solução através de acordo, mas alertar que este acordo deve respeitar a situação concreta do processo e o Princípio da Irrenunciabilidade dos Direitos Trabalhistas, sob pena de esquecer toda história do Direito do Trabalho e objetivo de sua existência.

Fica o convite para reflexão sobre o tema, em véspera da Semana Nacional de Conciliação Trabalhista, que ocorrerá de 13 a 17 de Junho, em todo o País.

Fernando José Hirsch

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