No dia 29 de agosto, comemoramos o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica. Nesta data, em respeito à igualdade, à liberdade e ao dever de não discriminação das mais diversas formas de famílias e aos filhos que delas se originam, abordaremos os problemas no registro da dupla maternidade, após a denominada inseminação caseira.
Casais lésbicos têm optado pela inseminação caseira em razão do alto custo da inseminação artificial. De acordo com os valores praticados pelas clínicas, a inseminação artificial pode custar entre 15 e 20 mil reais por tentativa. Além disso, não há cobertura por plano de saúde, segundo decisão do STJ[1], e existe longa fila de espera dos programas de reprodução assistida do Sistema Único de Saúde. O SUS, atualmente, conta com poucos hospitais que ofertam programas de fertilização, e somente alguns oferecem o tratamento de forma totalmente gratuita.
Assim, a inseminação assistida é acessível apenas às famílias que têm condições financeiras para realizar o procedimento de forma particular ou aguardar as longas filas do Sistema Único de Saúde.
Tal realidade segrega os casais lésbicos da possibilidade de gerar filhos com assistência de uma clínica especializada, e a única saída encontrada por muitas é a inseminação caseira, que não envolve relação sexual e não tem acompanhamento médico. O material genético é colocado em uma seringa e injetado no corpo da mulher que deseja engravidar.
Não se trata de procedimento proibido no Brasil, desde que não ocorra a cobrança pelo material genético, o que é vedado pelo Conselho Federal de Medicina.
O problema surge quando do registro de filha ou de filho proveniente de uma inseminação caseira. Por não haver uma declaração de responsável técnico de clínica de reprodução, conforme prevê o inciso II do art. 17 do Provimento nº 63 do CNJ, não é possível registrar a dupla maternidade. Enquanto na inseminação artificial as mães conseguem, na inseminação caseira não.
A solução passa, assim, pela desburocratização do registro de filiação da dupla maternidade.
Sabendo dessa dificuldade, o IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família entrou com pedido de alteração do Provimento nº 63, requerendo a retirada da exigência da declaração do médico ou responsável pela clínica de forma a possibilitar que as pessoas que realizaram inseminação caseira possam registrar a criança diretamente no cartório, promovendo o caminho da extrajudicialização.
O pedido de providências ainda está em andamento, e o CNJ tem ouvido diversas entidades que fazem parte dessa discussão.
Outra solução, enquanto o Provimento não for alterado, pode vir do ajuizamento de ação judicial para reconhecimento da dupla maternidade para suprir a ausência administrativa e dar às famílias mais amparo.
É necessário reconhecer e garantir os direitos de todas as formas de família!
Brasília, 29 de agosto de 2023.
[1] “Salvo disposição contratual expressa, os planos de saúde não são obrigados a custear o tratamento médico de fertilização in vitro.” Essa foi a tese firmada pela Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (Tema nº 1.067)
Isabella Magalhães
Advogada da LBS Advogadas e Advogados