Um trabalhador viaja para outra cidade com uma entrevista de emprego agendada, é selecionado para a vaga que estava concorrendo, assina um chamado “pré-contrato”, deixa toda a documentação com os representantes da empresa e lhe é dito que ele deve começar seu trabalho em uma semana. Ele volta para sua cidade e, na semana seguinte, viaja de mala e cuia para iniciar sua nova jornada. Ao chegar na empresa, nada feito. É dito a ele que as coisas mudaram e que contratar alguém agora não está mais nos planos da empresa, sem maiores justificativas. E agora? O que fazer?
No âmbito jurídico, muito se ouve falar da chamada teoria da perda de uma chance.
Resumidamente, trata-se de uma construção doutrinária reconhecida pela jurisprudência de nosso país que busca uma indenização àquele que tinha uma expectativa de que algo ocorresse e lhe gerasse algum benefício ou até mesmo evitasse uma desvantagem.
Nas palavras do Sérgio Cavalieri Filho, “caracteriza-se essa perda de uma chance quando, em virtude da conduta de outrem, desaparece a probabilidade de um evento que possibilitaria um benefício futura para a vítima, como progredir na carreira artística ou militar, arrumar um melhor emprego, deixar de recorrer de uma sentença desfavorável pela falha do advogado, e assim por diante. Deve-se, pois, entender por chance a probabilidade de se obter um lucro ou de se evitar uma perda”.
Estamos aqui falando, então, de um dano emergente, ou seja, a chance já existia na situação concreta e, por ato ilícito de outrem, a vítima teve suas expectativas frustradas.
Ora, como essa construção doutrinária tão ímpar e por demais discutida principalmente no âmbito do direito civil pode abarcar o direito do trabalho? É exatamente o caso do trabalhador que se planejou para iniciar em um novo emprego e, sem qualquer justificativa, teve a expectativa frustrada.
É possível, sim, o pagamento de uma indenização a esse trabalhador, mesmo sendo certo que não há aqui uma obrigação real de que determinada empresa contrate este ou aquele indivíduo, pois aqui estamos falando de algo que se baseia no princípio da boa-fé e dever de lealdade que deve existir nas relações contratuais.
A jurisprudência é firme no sentido de que a frustação da promessa de emprego pela empresa que deixou clara a possibilidade da respectiva contratação, via de regra, caracteriza a ocorrência de danos ao trabalhador que teria virado empregado desta empresa.
O dano, aqui, consiste exatamente no fato de que o empregador teve incorporado a seu patrimônio jurídico uma chance real de contratação, tendo real possibilidade de obter os lucros advindos daquele emprego.
Reconhecendo a perda de uma chance, o Tribunal Regional da 10ª Região recentemente decidiu da seguinte maneira:
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PROMESSA DE CONTRATAÇÃO. CARACTERIZAÇÃO. A jurisprudência trabalhista tem entendido que as fases preliminares de negociação e seleção a uma vaga de trabalho geram para o trabalhador expectativa de contratação, caracterizando um pré-contrato, a teor do art. 422 do Código Civil, bem como que o descumprimento de obrigações a que se comprometeram as partes, é capaz de ensejar reparação civil. Existindo nos autos prova de que a empresa realizou promessa de futura contratação do autor, correta a sentença que deferiu a indenização por danos morais.
(TRT-10 – RO: 00747201400310006 DF 00747-2014-003-10-00-6, Relator: Maria Regina Machado Guimarães, Data de Julgamento: 11/05/2015, 1ª Turma, Data de Publicação: 15/05/2015 no DEJT)
Porém, um requisito aqui é importantíssimo: o nexo entre a conduta do futuro empregador e o dano causado ao trabalhador. Sabemos que há casos em que o indivíduo, distorcendo a realidade por ele vivenciada, imagina haver um dano onde este de fato não ocorreu.
É o caso, por exemplo, do trabalhador que rescinde precipitadamente seu atual vinculo de emprego imaginando que se trata de promessa de contratação sendo que, na verdade, ainda está em fase de seleção para aquela determinada vaga.
Nesse caso, vemos que, a culpa pelo dano gerado (rescisão do contrato de trabalho anterior) não foi exclusiva da empresa que supostamente realizou a promessa de contrato, sendo a pretendida indenização indevida, tendo em vista não ter havido qualquer conduta ilícita da empresa.
DANOS MORAIS. PRÉ-CONTRATAÇÃO. PROMESSA DE EMPREGONÃO CUMPRIDA. NÃO CONFIGURAÇÃO. Firmado o pré-contrato de trabalho, em face do artigo 442 , caput, da CLT , qualquer das partes terá o direito de exigir a celebração do contrato definitivo, a teor do art. 440 CC , aplicado subsidiariamente ao Direito do Trabalho. Se o estipulante (empresa ou trabalhador) não der execução ao contrato preliminar, poderá a outra parte considerá-lo desfeito, e pedir perdas e danos. Apesar da seleção do currículo, a reclamante não foi submetida a entrevista, fase administrativa essencial para aprovação e contratação. Inexiste pré-contratação, tampouco o nexo causal que configure o dano moral, passível de reparação civil.
TRT-10 – RO: 0136-2008-018-10-00-9. Relator: Bertholdo Satyro, Data de Julgamento: 11/05/2015, 3ª Turma, Data de Publicação: 22/08/2008 no DEJT
Concluímos, portanto, que para haver o pedido de indenização pelo dano gerado pela promessa de contratação não cumprida, baseado na teoria da perda de uma chance, imprescindível se faz que a chance seja real e, mais ainda, que a culpa pela não execução do acordado entre as partes seja exclusivamente da parte da empresa que firmou o pré contrato e frustrou os planos do trabalhador.