Sob o pretexto de diminuição de custos e fomento da economia, atualmente, tramitam no Congresso Nacional algumas propostas de projetos de lei que autorizam formas genéricas de contratação da força de trabalho, colocando em risco garantias trabalhistas atualmente consolidadas.
O primeiro que merece comentários é o PL nº 3.785/2012, que versa sobre o contrato de trabalho intermitente. Trata-se de modalidade de contratação por lapso de tempo descontínuo, “podendo compreender períodos determinados em dia ou hora, e alternar prestação de serviços e folgas, independentemente do tipo de atividade do empregado ou empregador”¹.
Embora a proposta contenha a previsão de que o trabalhador intermitente não poderá receber tratamento diferenciado daquele conferido ao funcionário admitido por meio de contrato de trabalho convencional, expressamente determina que o empregado intermitente terá sua remuneração calculada de maneira proporcional ao período efetivamente laborado.
Além de uma remuneração minorada, o contrato de trabalho intermitente possui facetas prejudiciais ao empregado, já que, ainda que de maneira implícita, exige que o trabalhador permaneça de sobreaviso para atender eventual solicitação do empregador para comparecer ao labor.
Nesse ponto há uma contradição entre a justificativa dada para fundamentar a contratação intermitente e a realidade fática do trabalhador. Isso porque, a despeito de o PL nº 3.785/2012 fundamentar sua proposta com base em uma maior liberdade para o empregado que, por trabalhar de maneira descontínua, em tese, teria mais tempo para se dedicar a assuntos pessoais ou mesmo a outras atividades profissionais ou intelectuais, na realidade acaba por limitar o âmbito de atuação do obreiro.
Ora, não necessariamente o funcionário poderá ditar antecipadamente que dias irá trabalhar, tampouco terá meios de se programar quanto a eventuais convocações para o serviço inicialmente não agendadas, mas solicitadas pelo empregador.
Em síntese, o trabalhador ficará à disposição do empregador, mas receberá apenas pelo tempo em que efetivamente trabalhar. A disponibilidade do empregado, que estará impossibilitado de vender sua força de trabalho para outros empregadores, não será efetivamente recompensada. Salário e verbas trabalhistas serão calculados apenas e tão somente sobre o tempo de execução do serviço, ou seja, haverá menos dinheiro no bolso do trabalhador!
Outra modalidade atípica de contratação diz respeito ao regime de trabalho de curta duração, previsto no PL nº 3.342/2015. Por meio deste pacto, poderá ser instituído um labor de pequena extensão, sob o fundamento de se facilitar a contratação de mão de obra em atividades sazonais.
Diferentemente do contrato intermitente, o regime de trabalho de curta duração tem limite fixado na proposta legislativa, podendo ser firmado por 14 dias corridos, levando-se ainda em consideração que o somatório dos prazos contratuais não poderá ultrapassar 70 dias de labor no ano civil.
A falta de limites claros no projeto permite o uso dessa modalidade contratual em qualquer atividade econômica, criando um grupo de trabalhadores sazonais e com direitos limitados à temporada trabalhada. Não há estudos e nem comprovação séria de que essa medida seja eficaz na geração de empregos nem no combate à informalidade. É certo, porém, que as incertezas de um trabalho inconstante acompanharão os trabalhadores atingidos por este atípico contrato de trabalho.
As pretendidas inovações não param por aqui. Enquanto as duas modalidades de contratação acima expostas buscam flexibilizar a duração do trabalho prestado, o contrato multifuncional, previsto no PLS nº 190/2016, busca alterar o modo da prestação de serviços.
Assim, pretende-se que os artigos 442 e 468 da Consolidação das Leis Trabalhistas sejam modificados para expressamente autorizar o trabalhador com diversas atividades distintas. Utilizando o exemplo dado na justificativa do próprio PLS, a ideia seria regulamentar o caso de um trabalhador que, em razão da necessidade da empresa, tem sua atividade principal desdobrada em diversos outros afazeres, como é o caso da “secretária que não é só secretária, pois atende as ligações da empresa, serve cafezinho e ainda dá suporte à equipe”².
Sob a ótica do trabalhador, as modalidades de contratação acima expostas, longe de representarem inovações benéficas, abrem espaço para uma série de inseguranças que, ao final, acabam por fragilizar o empregado, tornando também incerto o próprio vínculo formal de emprego. Com efeito, além de incertezas relacionadas aos limites das referidas contratações, é necessário se atentar para que o discurso da geração de empregos não represente, em verdade, retrocesso para o Direito do Trabalho e, assim, prejudique em muito os trabalhadores.
Sarah Cecília Raulino Coly é sócia e Advogada da área trabalhista de LBS Advogados.
Referências
¹ Artigo 1º, parágrafo único, do PL nº 3.785/2012.
² Justificativa do PLS nº 160/2016.