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Convenção nº 158 da OIT: a garantia contra o despedimento arbitrário – em julgamento há mais de 25 anos – volta à pauta do STF

Trabalhadores e trabalhadoras mobilizam-se uma vez mais na defesa de seus direitos, neste momento em que se reinicia o julgamento da ADI nº 1.625 e se inicia o julgamento da ADC nº 39, no âmbito do Supremo Tribunal Federal. 

Nessas ações, discute-se a vigência da Convenção nº 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que estabelece proteção contra a despedida sem justa causa, ratificada pelo Brasil e revogada unilateralmente pelo Presidente da República, em 1996, que a denunciou no plano internacional.

A ADI discute, fundamentalmente, a inconstitucionalidade do Decreto Presidencial, pela ausência de submissão ao Parlamento, único legitimado a alterar a legislação nacional.

 

A Convenção nº 158 da OIT

A Convenção nº 158 da OIT é norma internacional, cuja declaração de vigência plena dará maior segurança no emprego à pessoa trabalhadora[1], na medida em que daria efetividade ao direito social da vedação à dispensa arbitrária, regra já inscrita no inciso I do art. 7º da Constituição, mas ainda pendente de regulamentação por Lei Complementar[2].

A Convenção sobre o Término da Relação de Trabalho por Iniciativa do Empregador – como é conhecida a Convenção nº 158 –, entrou em vigor no plano internacional em 23/11/1985.  No Brasil, depois de aprovada pelo Decreto Legislativo nº 68, de 16/09/1992, e Depositada a Carta de Ratificação junto à OIT, passou a viger em 05/01/1996. Finalmente, foi promulgada pelo Decreto nº 1.855, de 10/04/1996, ato que deu publicidade interna à incorporação da Convenção ao direito doméstico, conferindo-lhe executoriedade no território nacional[3].

 

Perda da vigência

A Convenção nº 158 da OIT foi denunciada no plano internacional e o Decreto nº 2.100, de 20/12/1996, deu publicidade interna no sentido de que a referida norma deixaria de vigorar no Brasil a partir de 20/11/1997[4].

 

A ADI nº 1.625 e seu julgamento

Inconformados com a denúncia da Convenção, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), em junho de 1997 – há mais de 25 anos! –, ingressaram com Ação Direta de Inconstitucionalidade no STF.

Como pedido principal, específico, pretenderam a inconstitucionalidade do Decreto nº 2.100/1996, sob o argumento da violação ao art. 49, inciso I, da Constituição, que prevê competência exclusiva do Congresso Nacional para resolver sobre tratados e atos internacionais.

O julgamento desse pedido específico, todavia, impõe ao STF debruçar-se sobre questão jurídica mais ampla, relacionada não apenas com o mérito da Convenção da OIT ou com a sua forma de aplicação, mas com a própria possibilidade de o Presidente da República considerar tratado internacional inaplicável no âmbito interno sem autorização parlamentar, na medida em que a aprovação de convenção ou de tratado exige tramitação legislativa para a sua aplicação.

Entre idas e vindas, desde o seu ajuizamento em 1997, até a retomada do seu julgamento pelo STF, agora em sessão virtual pautada entre os dias 21 a 28 de outubro de 2022, sete votos já foram colhidos, dentre os onze que representam a composição plena do Tribunal.

Desses sete votos, quatro convergem para a procedência ou procedência parcial do pedido específico (Min. Maurício Correa e Min. Carlos Britto, pela procedência parcial; Min. Joaquim Barbosa e Min. Rosa Weber, pela procedência), declarando que a Convenção nº 158 da OIT somente perderia a eficácia plena mediante o referendo do Decreto nº 2.100/1996 pelo Congresso Nacional.

Um deles declara a improcedência da ação (Min. Nelson Jobim).

À exceção deste, quanto à questão jurídica mais ampla, os votos pela procedência, procedência parcial e, mesmo, pela improcedência (Min. Teori Zavascki e Min. Dias Toffoli) já declarados convergem entre si, reconhecendo que a denúncia presidencial de tratados internacionais não prescinde da sua aprovação pelo Congresso Nacional.  Apesar disso, os Ministros Teori Zavascki e Dias Toffoli não restabelecem a vigência da Convenção, mantendo a eficácia do Decreto, ao fixarem que o entendimento deverá ser aplicado a partir da publicação da ata de julgamento da ADI.

Faltam votar os Ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Kassio Nunes e André Mendonça.  Não votarão os Ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia por sucederem, respectivamente, os Ministros Joaquim Barbosa, Ayres Britto, Maurício Corrêa e Nelson Jobim.

A sessão virtual de julgamento da ADI nº 1625 iniciou-se à zero hora do dia 21 de outubro e tem previsão de término às 24 horas do dia 28 seguinte.

 

ADC nº 39

Paralelo ao seu julgamento, tramita a Ação Direta de Constitucionalidade nº 39 (ADC nº 39), pela qual entidades sindicais patronais, de âmbito nacional, por sua vez, pretendem a declaração da constitucionalidade do Decreto.

A questão comum às ADI nº 1.625 e ADC nº 39 é de altíssima relevância, por influenciar o ordenamento interno de garantia aos direitos sociais da pessoa trabalhadora — tomado o caso individual da Convenção nº 158 da OIT. Mas não só.

Talvez a sua maior importância seja a possibilidade de se pôr fim ao arbítrio representado pela possibilidade de denúncia presidencial de tratados internacionais, em especial os que têm por objeto Direitos Humanos e Fundamentais, uma vez que foram ratificados, validados, promulgados e internalizados pelo Parlamento, passando a integrar o ordenamento jurídico constitucional e supralegal, conforme jurisprudência já consagrada pelo STF.

 

Avaliação

Acompanhamos a ADI nº 1.625 desde sua propositura e em todas as Sessões com enorme expectativa de conclusão e acolhimento da tese, pois uma a das mais longevas ações diretas em tramitação junto ao STF.

Na Sessão de julgamento em 2016, quando da leitura do voto-vista do Ministro Teori Zavascki, a então Presidente, Ministra Cármen Lúcia, observou a necessidade de se concluir o julgamento de tão relevante matéria e que estava em tramitação por muitos anos, sem conclusão.

Ainda assim, passaram-se quase seis anos para que retornasse ao Plenário.

A ADC, ajuizada muito posteriormente, sinaliza uma estratégia de atuação das Confederações patronais que nunca se conformaram com a ratificação da Convenção nº 158 da OIT.

O voto-vista do Ministro Dias Toffoli traça o histórico dos julgamentos e votos que o precederam, pavimenta e sinaliza uma possível solução de acolhimento da tese geral, embora descarte, na prática, submeter a Convenção ao seu processo natural de exame pelo Parlamento.

Na ADI nº 1625, há 6 (seis) votos proferidos no sentido do acolhimento da tese geral (impossibilidade de revogação ou denúncia unilateral de trabalho por Presidente da República, sem submissão ao Parlamento). Portanto, já se conformou uma maioria para o acolhimento da tese geral.

O que ainda estaria pendente seria a consequência específica em relação a Convenção nº 158/OIT.

No entanto, a ADC nº 39 ainda não havia, até o encerramento desta nota[5] recebido, senão, o voto do Ministro Relator. É possível, ainda, que algum ministro solicite destaque para julgamento em Plenário telepresencial. Somente saberemos, com certeza e voltaremos a analisar de forma mais ampla, quando do encerramento do período no Plenário virtual.

 

Brasília, 21 de outubro de 2022.

 

[1] O art. 10 da Convenção nº 158 da OIT estabelece o seguinte: “Se os organismos mencionados no artigo 8 da presente Convenção chegarem à conclusão de que o término da relação de trabalho é injustificado e se, em virtude da legislação e prática nacionais, esses organismos não estiverem habilitados ou não considerarem possível, devido às circunstâncias, anular o término e, eventualmente, ordenar ou propor a readmissão do trabalhador, terão a  faculdade de ordenar o pagamento de uma indenização adequada ou outra reparação que for considerada apropriada.”

[2] Vide a ADIN nº 1.480-DF, que condicionou a sua eficácia ao disposto nos artigos 7º, I, da Constituição e 10 do ADCT.

[3] ADI nº 1625, voto da Ex.ma Ministra ROSA WEBER.

[4]O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, torna público que deixará de vigorar para o Brasil, a partir de 20 de novembro de 1997, a Convenção da OIT nº 158, relativa ao Término da Relação de Trabalho por Iniciativa do Empregador, adotada em Genebra, em 22 de junho de 1982, visto haver sido denunciada por Nota do Governo brasileiro à Organização Internacional do Trabalho, tendo sido a denúncia registrada, por esta última, a 20 de novembro de 1996”.

[5] Às 17:25 horas do dia 21 de outubro de 2022

José Eymard Loguercio

Sócio da LBS Advogados
E-mail: eymard@lbs.adv.br

Ricardo Carneiro

Sócio da LBS Advogados
E-mail: ricardo.carneiro@lbs.adv.br

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