A garantia de não discriminação pelo gênero já não está disposta na Constituição federal e na Consolidação das Leis do Trabalho?
Atualmente, mulheres ganham 20% a menos do que os homens conforme dados publicados pela ONU em 2022[1], sendo que grande parte dessa desigualdade se deve por discriminação com base no gênero. Portanto, é essencial para nossa sociedade que existam outros meios efetivos para que a igualdade salarial seja concretizada.
A Lei nº 14.611/23[2], nesse sentido, objetiva coibir a discriminação salarial, regulamentando critérios de igualdade salarial entre mulheres e homens e alguns procedimentos que devem ser observados pelas empresas, bem como sanções a serem aplicadas em caso de descumprimento.
A lei altera a CLT, incluindo os parágrafos 6º e 7º ao art. 461, segundos os quais:
- 6ºNa hipótese de discriminação por motivo de sexo, raça, etnia, origem ou idade, o pagamento das diferenças salariais devidas ao empregado discriminado não afasta seu direito de ação de indenização por danos morais, consideradas as especificidades do caso concreto.
- 7ºSem prejuízo do disposto no § 6º, no caso de infração ao previsto neste artigo, a multa de que trata o art. 510 desta Consolidação corresponderá a 10 (dez) vezes o valor do novo salário devido pelo empregador ao empregado discriminado, elevada ao dobro, no caso de reincidência, sem prejuízo das demais cominações legais.” (NR)
A Lei contém medidas que poderão ser ferramenta na efetividade da igualdade salarial entre homens e mulheres, vejamos:
- mecanismos de transparência salarial e remuneratória, sendo obrigatória para empresas com mais de 100 funcionários a publicação de relatório comparativo entre salários, remunerações e a proporção de ocupação de cargos de direção, gerência e chefia preenchidos por mulheres e homens;
- incremento da fiscalização contra a discriminação salarial e remuneratória;
- disponibilização de canais específicos para denúncias de discriminação salarial;
- capacitação de gestores e lideranças a respeito da temática de equidade entre homens e mulheres no mercado de trabalho;
- fomento à capacidade e formação de mulheres para o ingresso, permanência e ascensão no mercado de trabalho em igualdade de condições com os homens;
Identificada desigualdade salarial ou remuneratória, o empregador deverá apresentar e implementar plano de ação para mitigá-la, com metas e prazos, garantida a participação de representantes das entidades sindicais e de representantes das trabalhadoras e dos trabalhadores nos locais de trabalho.
Por fim, a Lei prevê a aplicação de multa para as empresas que praticarem a discriminação salarial por motivo de sexo, raça, etnia, origem ou idade, no valor de 10 vezes o valor do novo salário devido, elevada ao dobro no caso de reincidência, sem prejuízo das demais cominações legais.
Além disso, em caso de descumprimento das medidas, o empregador poderá ser multado em até 3% da folha de pagamento da empresa, limitado a 100 salários-mínimos.
O Poder Executivo federal, por sua vez, deverá publicar, além das informações de relatórios, indicadores atualizados periodicamente sobre mercado de trabalho e renda desagregados por sexo, inclusive indicadores de violência contra a mulher, de vagas em creches públicas, de acesso à formação técnica e superior e de serviços de saúde, bem como demais dados públicos que impactem o acesso ao emprego e à renda pelas mulheres e possam orientar a elaboração de políticas públicas.
Vale mencionar também que, visando fortalecer a construção de medidas eficazes para a igualdade salarial entre mulheres e homens, o Governo Federal publicou o Decreto nº 11.514 instituindo Grupo de Trabalho Interministerial para a elaboração de proposta de Plano Nacional de Igualdade Salarial e Laboral entre Mulheres e Homens.[3]
O Grupo se reunirá quinzenalmente e terá duração de 180 dias, contado da data da primeira reunião, prorrogável uma vez por igual período, por meio de ato da Ministra de Estado das Mulheres.
O caminho ainda é longo. A nova Lei, de qualquer forma, é de suma importância para reduzir a desigualdade salarial calcada em gênero, que, infelizmente, ainda existe no mercado de trabalho brasileiro.[4]
Brasília e Campinas, 4 de julho de 2023.
[1] https://brasil.un.org/pt-br/199919-relat%C3%B3rio-da-oit-aponta-que-mulheres-recebem-20-menos-do-que-homens
[2] Lei de 3 de julho de 2023, decorrente de aprovação de Projeto de Lei apresentado pelo Poder Executivo no dia 8 de março deste ano.
[3] Leia mais sobre o Grupo de Trabalho: https://lbs.adv.br/artigo/medidas-do-governo-marcam-o-1o-de-maio/
[4] Para ler mais sobre a igualdade salarial entre mulheres e homens, acesse a Síntese Especial – Subsídios para Debate nº 13, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – DIEESE: https://www.dieese.org.br/outraspublicacoes/2023/sinteseEspecial13.html
Luciana Lucena Baptista Barretto
Sócia da LBS Advogadas e Advogados
E-mail: luciana.barretto@lbs.adv.br